Produtor rural e carga tributária

Já dissemos em muito em artigos, entrevistas e em livro sobre carga tributária. Mais recentemente me dei conta de que sempre falamos em relação a carga tributária contida nos setores econômicos como serviços, comércio e indústria e que nunca em revistas especializadas de direito tributário se aponta a tributação do setor rural.

Pode parecer à primeira vista que quando se fala nesta pesada responsabilidade esteja incluído aí o setor rural. Mas, não está. Imaginamos: Será a distância das cidades com o campo que dá o tom de uma pouca abordagem, ou será o conteúdo econômico do setor ?  Ou mais, será a falta de articulação do homem do campo para enfrentar a pesada tributação que Municípios, Estados e União fazem recair sobre o produto e sobre o produtor rural ?

Pensamos que de tudo um pouco desemboca nesta situação. Existem pequenos, médios e grandes produtores rurais. Mesmo o pequeno que produz para si e seus familiares, frutas e legumes, hortaliças, carne e ovos, pode pensar que não faz parte do sistema como contribuinte tributário. Mas quem pensa assim está enganado. Dormindo em sua casa no campo, de um jeito ou de outro o homem vai consumindo carga tributária, desde uma lâmpada acesa na madrugada, até o palito de fósforo que consume, tem tributos. Se não tem empregados e vive em economia familiar paga contribuição social elevada para si e para seus familiares ao INSS para que possam ter direito a aposentadoria e atendimento na rede de saúde que é precária. Nas roupas que adquire pronta ou naquelas que faz com tecido comprado a metro, tem carga tributária. Se assim o faz teve que comprar uma máquina de costura. Se dá ração para os peixes, estão ali embutidos tributos como o ICMS, IPI, PIS Cofins etc.

O médio produtor rural que avança mais na economia tem mais carga tributária ainda porque suas ferramentas de trabalho são mais volumosas, consume mais energia elétrica, adquire insumos, faz estoque, consume gasolina, e paga mais por isso.

E o grande produtor rural pessoa física ? Esse, como os demais, para viver e progredir depende do sol, chuva e do frio na medida certa que muitas vezes ou é excessiva ou escassa. Vive no mar, quero dizer, nas montanhas das incertezas.

Será ele obrigatoriamente empregador, assinando carteira de trabalho para diversos homens e mulheres, e como não vive mais em economia familiar pagará ao INSS contribuições sociais sobre a folha de pagamento e pagará também o FUNRURAL à alíquota de 2,3% sobre o valor do produto rural que comercializa. Paga mal e errado, indevidamente.

Na verdade, muitas vezes, ele nem sabe que paga o Funrural porque, ao entregar o seu produto ao supermercado, ao exportador e a outros adquirentes, pela lei do INSS ficam estas empresas obrigadas a descontar 2,3% do valor que receberá pela venda e a repassar ao fisco logo em seguida. Ele, frágil, necessitando realizar logo o negócio porque seus produtos sempre são perecíveis e se deterioram rápido demais, nunca tem do adquirente uma prova, uma guia paga em banco, para ficar tranqüilo, e saber que aquele Funrural foi quitado e que ele então estaria quite com a fiscalização. 

Ao adquirir insumos, equipamentos, materiais e embalagens, exerce sua atividade como se empresa fosse sem contudo, ter os mesmos direitos de uma empresa. Assim, naquilo que adquire para fomentar sua atividade recebe as mercadorias acompanhadas de notas fiscais, e nela vê a carga tributária ao menos do ICMS e do IPI imposto sobre a industrialização, (existem outros tributos que paga e nem sabe que está pagando) e como vai vender em seguida ao mercado o seu produto rural, não pode, porque a lei não lhe deu esse direito, aproveitar daqueles impostos, daqueles créditos tributários para possível compensação ou restituição em dinheiro.

O Brasil volta a discutir a reforma tributária e hoje está-se debatendo se a CPMF (outro tributo pago pelo produtor rural) será prorrogada ou não.

Mas o fato é que tanto no Funrural quanto no ICMS e no IPI, está o produtor rural pagando mais do que as demais empresas privadas gerando desequilíbrio de forças econômicas e sociais. Aqui no nosso Estado existe um aceno do Governo para que o ruralista possa registrar em livro o seu crédito de ICMS que vem nas notas fiscais. Mas fica nisso e em nada o ajuda. Aliás, este efeito se chama de cumulatividade do imposto. A cada circulação de produtos se paga maior carga. Se o produtor é isento do ICMS e do IPI na saída do produto da sua propriedade, os impostos cobrados ao longo da cadeia produtiva nunca são devolvidos. Recentemente o Governo Estadual deu o direito ao crédito acumulado para grandes empresas exportadoras o utilizarem como forma de pagamento de tributos.

A falta de transparência para o setor rural é a mãe da injustiça social e da inadequação do sistema tributário. Mas existem remédios políticos e jurídicos para contornar essa situação. O que não podemos ter é a descrença de dias melhores.

Ricardo Dalla, é advogado desde 1983, voltado ao direito constitucional tributário, professor universitário para pós graduação, mestre e autor de livro. Ah, é capixaba !

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