Novo modelo de cobrança do ICMS alivia contribuinte, mas gera perdas ao Estado.

Ricardo Dalla, Geraldo Pinheiro e José Lino Sepulcri: críticas e aplausos à decisão do STF

  ROBERTO JUNQUILHO

   
Valor variável entre R$ 540 milhões a R$ 1 bilhão é a estimativa de perda, para o Espírito Santo, por conta da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), adotada no último dia 22, que reduz a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) aplicada sobre serviços essenciais às pessoas, como energia elétrica e telecomunicações, de 25% para 17%. Os números são apontados pelo advogado tributarista Ricardo Correa Dalla, presidente do Instituto Brasileiro de Direito Tributário (IBDT), e o economista e auditor fiscal Geraldo Pinheiro, presidente do Sindicato do Pessoal do Grupo de Tributação, Arrecadação e Fiscalização (Sindifiscal-ES).

A medida, de outro lado, beneficia o contribuinte, inclusive com geração de crédito de 8% pago a mais em operações anteriores à alteração, o que é bem recebido pelo presidente da Federação do Comércio e Serviços (Fecomércio-ES), José Lino Sepulcri". "É uma medida aplaudível, um mínimo remendo à reforma tributária tão esperada. A medida só não é boa para os governos que priorizam a receita a qualquer custo para cobrir as despesas que não se dispõem a cortar. Para esses, quanto mais arrecadar, melhor, não importa como".

"Excetuando a alíquota de 7% de ICMS aplicada aos produtos da cesta básica, voltada ao consumo de pessoas com renda baixa, como ovos, massas alimentícias, arroz, feijão e alguns outros mais, 17% é a alíquota comum a todo o restante de produtos, explica o advogado Ricardo Dalla, defensor de uma reforma tributária, "acompanhada de uma reforma administrativa", como forma de reduzir a carga tributária.

"É de 25% aplicada sobre produtos de luxo como bebidas alcoólicas, perfumaria, passagens aéreas, embarcações de esporte e lazer, e tantos outros, de nítido caráter não essencial à sobrevivência humana. O STF considerou que 25% sobre contas de energia elétrica e telecomunicações – contas de telefonia, celular, internet e muitas outras – são produtos essenciais ao ser humano, portanto devem pagar 17%", comenta o advogado tributarista, e ressalta: "Quem pagou 25% e não se aproveitou dos créditos advindos das notas fiscais de entrada dos serviços de energia elétrica e telecomunicações, terá o direito de reaver 8% pagos a mais".

No seu entendimento, "o debate de incidência tributária deve respeitar os tesouros municipal, estadual e federal, por se tratar na essência de verba pública arrecadada sobre o patrimônio do particular (pessoa física e jurídica) para ser aplicada nos fins comuns". Ele destaca que "o crédito somente é admitido às empresas de lucro presumido ou de lucro real. As do Simples Nacional não serão beneficiadas, porque a LC 123/06 proíbe o benefício desse ICMS para elas".

Ricardo Dalla explica que, pela lei geral, a utilização do crédito de ICMS restringe-se a três hipóteses: primeiro, quando for objeto de operação de saída de energia elétrica; segundo, quando consumida no processo de industrialização; e terceiro, quando seu consumo resultar em operação de saída ou prestação para o exterior, na proporção destas sobre as saídas ou prestações totais. "Segundo a corrente vencedora no STF, pouco importam as características do contribuinte atingido pela técnica da seletividade e, nesse sentido, eu estou entendendo que o julgado favorece as pessoas físicas e as jurídicas por algumas razões".

O auditor fiscal Geraldo Pinheiro afirma que, do ponto de vista da arrecadação dos estados e do Distrito federal, a medida representará graves perdas de ICMS, considerando que a energia elétrica, telecomunicações e combustíveis representam os três maiores setores da economia que contribuem para as receitas dos entes federados.

"A estimativa de perda das entidades subnacionais com a referida decisão do STF é da ordem de 27 bilhões/ano. Se fizermos uma inferência do PIB do Espírito Santo em relação ao Brasil da ordem de 2%, haverá uma estimativa de perda de receita de ICMS da ordem de 540 milhões de reais/ano, calcula Geraldo. "Será necessária a modulação dos efeitos da decisão", afirma.

"Desde a implementação da constituição de 1988, a tributação destes setores ocorre com alíquota diferenciada de 25%, sendo, portanto, necessária uma adequação temporal, pois conforme manifestação do Consefaz [Conselho de Secretários de Estado de Fazenda, Finanças e Tributação], os estados e o Distrito Federal elaboraram os orçamentos dos planos plurianuais em 2020 e válidos até 2024, com base na receita prevista".

O valor estimado pelo auditor fiscal fica próximo dos números apontados por Ricardo Dalla, segundo os quais os estados temem uma perda de receita de R$ 26,6 bilhões. "Isso daqui para frente, a cada ano, na média geral, considero que o Espírito Santo perderá R$ 1 bilhão. Mas isso é na média geral".

Ricardo Dalla destaca que a perda poderá ser maior, considerando que "o agravamento desse montante ocorrerá pela determinação de se devolver 8% de ICMS cobrado da maioria das pessoas físicas e jurídicas nos últimos 60 meses ou cinco anos, como juros e correção monetária em favor dos contribuintes".

No contexto geral, José Lino Sepulcri, embora considere a medida tardia, acredita que, aplicada, vai possibilitar sobra de "mais renda para o consumo, gerando demanda. E a medida também atende a um princípio de justiça fiscal e social, porque a própria Constituição prescreve que a tributação deve ser inversamente proporcional à essencialidade do bem ou serviço".

Ricardo Dalla comenta: "A discussão é especialmente importante por impactar a cobrança, pelos estados, das alíquotas do ICMS aplicadas sobre serviços essenciais às pessoas como energia elétrica e telecomunicações, desde 1988 à base de 25%, o que corresponde na prática a uma alíquota efetiva de 33%, porque ela incide por dentro do valor e não sobre o valor da conta ou do boleto".

Geraldo Pinheiro destaca que, em tese, haverá uma redução do valor da tarifa a consumidores residenciais e uma redução de custos nos setores produtivos de bens e serviços, não se podendo afirmar, porém, que tais reduções, de fato, cheguem aos consumidores finais. "Vivemos uma demanda agregada de consumo reprimida em razão de milhões de desempregados que tem pouco ou nenhum acesso a bens de consumo. A redução de um tributo em apenas dois setores da economia na via judicial, em nosso sentir, não é suficiente para proporcionar o desenvolvimento da economia", diz.

Ele acrescenta: "Decisões como estas servem para aprofundar a discussão sobre uma verdadeira reforma tributária justa e solidária, que necessariamente deve seguir na direção da simplificação dos processos de tributação, redução gradativa da tributação sobre bens de consumo e elevação progressiva na tributação da renda".

A decisão

O Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou, na noite do último dia 22, o julgamento do RE 714.139, tema 745 das Repercussões Gerais, que discute o alcance do art. 155, § 2º, III, da Constituição Federal, que prevê a aplicação do princípio da seletividade ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

A discussão é especialmente importante por impactar a cobrança das alíquotas de impostos estaduais aplicadas a serviços essenciais, como energia elétrica e telecomunicações. Ao fim, prevaleceu a tese favorável ao contribuinte.

Notícia publicada em: https://www.seculodiario.com.br/economia/novo-modelo-de-cobranca-do-icms-aliviacontribuinte-mas-gera-perda-ao-estado

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